Rowan De Raven

Saturday, July 09, 2005
 
23h24. Ontem, na missa de 30º dia da vovó, novamente me senti perdida (e encontrada) na igreja. Nos últimos tempos, há duas personalidades dominantes se digladiando dentro de mim. Não são estranhas, not at all, mas velhas conhecidas que andavam quietas e agora acordaram. Uma é a "rebelde" que tem pintado as unhas de cores escuras (e se orgulhou em exibi-las em vermelho-sangue na igreja), que quer fazer um corte de cabelo maluco, mais duas – talvez até quatro – tatuagens, que pensa em cair no mundo, vivendo de subemprego em subemprego e não encanar com mais nada na m**** da vida. A outra personalidade é a "santa", e essa eu não via há uns 20 anos; ela pensou em procurar o padre depois da missa e se confessar, e pedir dicas de trabalhos voluntários, essa é a que pensa em se alistar à Cruz Vermelha ou adotar uma criança, e que voltou a considerar seriamente terminar seus dias num convento (idéia antiga!).

Nada para se preocupar, claro. Como sempre, covarde que sou, vou esperar que as duas adormeçam novamente sem fazer nada do que têm vontade. Em comum, ambas só têm o fato de que voltaram a pensar "se a vida vai ser sempre esse suplício inútil, por que Deus não me mostra um caminho ou então me leva embora daqui?" ou "ah se eu tivesse uma arma (e coragem)!", e as duas olham facas de cozinha com segundas intenções (bloody blind scissors!). By the way, voltei a me cortar faz alguns dias (agora chamam isso de "cutting", chique não?!), sinto que é porque preciso exercer algum poder sobre mim, qualquer um...

E agora deixando minhas insanidades e vida medíocre de lado, mais um pouco da Marquesa di Rudini (meio que assustadoramente, muito que ela sentia eu sinto, e muito que falavam dela, é como se falassem de mim – mal do nome, como sugeriu minha mãe?):

"Sinto que algo aconteceu em mim... algo que não consigo compreender. Às vezes, parece-me que estou sendo arrastada para fora da vida presente. É uma sensação estranha, como se eu estivesse fora da vida. Isto dura mais ou menos dois ou três dias, depois tudo volta à normalidade. Em seguida a essas crises me sinto ora arrebatada para Deus, ora dominada por um profundo abatimento em que todo o meu entusiasmo desfalece e em que não desejo mais crer, não desejo mais orar e me parece que minha prece cai sobre mim como um vento frio. Tenho então a sensação de que a vida é uma força cega que esmaga os seres sob a carga de um fatalismo inconsciente, sem alma, sem beleza. E nesses momentos não mais espero e não desejo nem a própria fé".

"Que se passava? Que se havia nela (na alma de Alessandra) que lhe tirava o sossego, que não lhe permitia harmonizar sua vida com a dos outros e encarar as coisas como a mesma simplicidade, com a mesma humildade com que o faziam as outras pessoas? Desde mocinha, os louvores e as lisonjas nela tinha incutido a segurança em si mesma e a certeza da própria superioridade, sentimentos que mais tarde haveriam de transformar-se na necessidade de independência e de isolamento, como quem sabe não pertencer à multidão e ter algo relevante para cumprir. Às vezes, sentia que qualquer coisa em seu íntimo escapava ao controle de sua consciência, como se fosse um destino obscuro mais forte do que a sua vontade, mas ao qual sua sede de vida e uma vaga sensação de medo a tornavam rebelde e hostil. Medo de quê? De quem?"

E para encerrar por hoje, palavras de Sto. Agostinho (validas para todas as Alessandras aqui mencionadas): "Minh’alma dilacerada e sangrando não se me ajustava mais e eu não sabia onde colocá-la". A Marquesa colocou a dela num convento carmelita. Onde será que a minha vai parar?

Un’altra volta, è stato un piacere ma per oggi basta di questo. Buona Notte!


Thursday, July 07, 2005
 

23h54. Como não tenho nada de novo para falar sobre mim – e nem isso é novidade – registro aqui algumas frases da Marquesa Alessandra di Rudini Carlotti del Garda, que apesar de ter morrido (freira carmelita) exatos 40 anos antes de eu nascer, teve uma vida bem mais interessante que a minha...

"São os únicos seres no mundo dignos de serem amados" (sobre os animais)

"Deixai-me, deixai-me. Não sou mulher que aceite enganos e desilusões. Não sou mulher que se curve conformada à frase idiota: Era o destino! O destino eu o faço conforme meus caprichos e desejos, e me defenderia galhardamente contra a força que se opusesse à minha vontade".

"Que será de mim? Sempre julguei que na vida fosse bastante a aprovação da própria consciência. Noto com amargura que não é assim. Mas enganam-se os que imaginam poder impor-me a sua vontade. Forte em meus direitos, saberei defender minha liberdade contra todos" ... "Penso que é sempre possível despojar uma criatura de todo o bem; nunca, entretanto, controlar e mudar o seu destino. E meu destino é inalterável".

E como dizem em alemão (a saber, um dos meus idiomas preferidos) sehr angenehm, aber ich muß jetzt gehen. Gute Nacht und bis bald!